Crânios trepanados do Neolítico |
I
maginem só: umburaco de 2.5 a 5 cm de diâmetro, perfurado à mão no
crânio de um homem vivo, sem qualquer anestesia ou assepsia, durante
longos 30 a 60 minutos. Esta é talvez a forma mais antiga de cirurgia
de cérebro conhecida: é a chamada trepanação
(de trupanon grego, broca). E uma das razões para realizar
este horripilante procedimento era talvez o mesmo que motivou cirurgiões
modernos, como o Dr. Egas Moniz, a realizar lobotomias
para aliviar
sintomas mentais.
Foram achados crânios com sinais de trepanação praticamente em todas as partes do mundo onde o homem viveu. Ela é provavelmente a operação cirúrgica mais antiga de todas: existem evidências que ela já era feita há mais de 40.000 anos atrás, no tempo dos Cro-Magnons. A trepanação foi realizada ao longo de todas as eras, provavelmente por razões diferentes. Foi praticada na Idade de Pedra, no Egito Antigo, na Grécia e nos tempos pre-históricos e clássicos romanos, no Oriente Médio e Distante, entre as tribos célticas, na China (antiga e recente), na Índia, entre o maias, astecas e Incas, entre os índios brasileiros (karaya e eugano), nos Mares de Sul, e na África do Norte e Equatorial (onde eles ainda são realizadas, inacreditavelmente). As primeiras descobertas históricas e médicas sobre a trepanação na Antigüidade foram feitas em 1867, por E.G. Squier, na América do Norte, e por Paul Broca, na Europa. |
Faca de trepanaçãoasteca de bronze "Trépanos de coroa" do seculo 18 |
Nós nunca saberemos como e quando o
homem primitivo chegou à descoberta de trepanação,
e só podemos especular sobre as razões pelas quais ela era
realizada. Os especialistas pensam que, de acordo com a cultura e com a
época, elas poderiam estar estas entre as seguintes:
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Trépanos de metal da Grécia antiga
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A trepanação podia sere feita
de duas maneiras: por abrasão de osso (usando uma pedra afiada ou
uma faca de vidro vulcânico) ou serrando (usando trépanos
semicirculares que cortavam por meio de um movimento circular constante,
como era feito pelas civilizações de América Central
e do Sul). Os egípcios inventaram o trépano circular, constituído
por um tubo com bordas dentadas, que corta muito mais fácil por
meio de rotação, e que foi usado extensivamente na Grécia
e Roma, dando origem ao "trépano de coroa", usado na Europa
entre o séculos 1 e 19. Uma das invenções principais
em tecnologia de trepanação foi a espiga central, que era
usada para centrar o movimento de rotação sobre o mesmo ponto
do osso, de forma que uma precisão melhor fosse alcançada.
Quanto tempo levava uma trepanação cirúrgica? Quando é feita em uma única sessão (sim, em algumas culturas a trepanação é feita em várias sessões, que podem levar até 12 dias!), ocupa de 30 a 60 minutos de serrar contínuo ou perfurar. Paul Broca, o onipresente neurocirurgião francês e antropólogo, determinou este fato experimentalmente em animais e cadáveres, em 1867. |
Serra de trepanação do século 19 |
Seria possível os pacientes sobreviverem
a uma operação tão drástica, sem antibióticos,
assepsia ou anestésicos?
É difícil de acreditar, mas julgando-se a partir do número de crânios que mostravam cura e regeneração do osso nas bordas, a proporção de pacientes que sobreviviam à provação de um trepanação era bastante alta, de 65 a 70%. Em 400 crânios examinados por um pesquisador, 250 mostravam recuperação. Em tempos modernos (séculos 14 a 18) esta proporção era muito mais baixa e às vezes aproximava-se de zero. Birner (1996) cita que um trepanador "profissional" chamado Mery, perdeu todos seus pacientes em 60 anos de atividade. A causa mais comum de morte era infecção do meninges ou do cérebro, ou hemorragia. Se estes fatores são cuidadosamente controlados (por exemplo, interrompendo a ação do trépano antes de tocar as meninges de cérebro), é uma operação relativamente segura. Em 1962, um neurocirurgião peruano executou um trepanação em um paciente com trauma craniano, usando os instrumentos cirúrgicos de Peru antigo. O paciente sobreviveu. |
De: A
História da Psicocirurgia Autor: Renato M.E. Sabbatini, PhD, Fonte: Revista Cérebro & Mente, junho de 1997 |
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